Por Antonio Graça*
O general Carlos Alberto Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República, pasta à qual está ligada a Secretaria de Comunicação Social (Secom), afirmou semana passada, em entrevista na abertura do 14º Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que a imprensa terá que fazer investigações cada vez mais profundas para escapar do congestionamento de notícias falsas e desinformação que estão circulando na própria mídia e nas redes sociais. “O jornalismo investigativo terá de ser investigativo ao quadrado”, afirmou.
Segundo ele, a imprensa tem responsabilidades e um código de ética e os que produzem desinformação não têm. “Isso faz com que as coisas sejam mais fáceis para os irresponsáveis, que estão vivendo seu momento de glória”, disse. Embora entenda que a liberdade tem de ser absoluta no uso da internet, Santos Cruz acredita que deve haver também “o limite da responsabilidade”.
Indagado sobre as atitudes do presidente Jair Bolsonaro em relação à imprensa, da qual muitas vezes tenta tirar a legitimidade, preferindo se comunicar pelas redes sociais, Cruz afirmou não concordar com a visão de que a mídia cria dificuldades para o governo. Para ele “não existe democracia sem jogo de pressão entre Executivo, Congresso, Judiciário, órgãos de controle, imprensa, partidos e o conjunto da sociedade”.
O general ponderou, no entanto, que as mídias sociais são um instrumento moderno de comunicação e é legítimo usá-las. “Mas como fazer isso, o grau de importância que se dá a elas, é algo que depende das características de cada um”, afirmou.
Bolsonaro e as redes sociais: “voluntarioso”
Sobre o papel da Secom e a opção de Bolsonaro de se comunicar predominantemente pelas redes sociais, Santos Cruz afirmou que algumas vezes tentou orientar o presidente. Chegou a ponderar que é preciso tomar cuidado com essas novas mídias, principalmente no que se refere à questão da individualidade do presidente e de sua função pública: “Houve uma ou outra conversa, à maneira de um aconselhamento, que o presidente seguia ou não”. Lembrou, no entanto, que Bolsonaro é muito voluntarioso em matéria de redes sociais.
De acordo com o general, a revolução digital mudou o mundo radicalmente. “Há quatro anos, gastava-se centenas de milhões de reais nas eleições, com propaganda eleitoral e marqueteiros”, lembrou. “Agora, gasta-se muito menos para ser eleito.” Para ele, as eleições agora apresentam um vínculo muito mais amplo com as mídias sociais do que com a mídia tradicional.
Perguntado pelos jornalistas Daniel Bramatti, presidente da Abraji, e Júlia Duailibi, da GloboNews, sobre sua demissão, ocorrida em 13 de junho, o general foi evasivo. Disse não saber o que motivou sua demissão. Mas afirmou também não ter perguntado ao presidente a razão da sua saída. “Não perguntei porque, a partir do momento em que ele me falou, não quis provocar constrangimentos”, disse. Mas afirmou também que, embora tenha saído do governo, continua torcendo para que ele dê certo.
Olavo de Carvalho? “Teria que baixar muito o nível”
Sobre os ataques que sofreu por parte de Olavo Carvalho, conhecido como guru do presidente, e de Carlos Bolsonaro, que teriam cavado sua demissão, afirmou: “Não vou discutir sobre essas personalidades públicas, porque teria que baixar muito o nível do meu palavreado.”
O general negou também que haja uma divisão no governo, com uma ala militar e uma ala ideológica, esta com orientação de Olavo de Carvalho. Segundo ele, nunca houve uma reunião de militares que ocupavam cargo de ministro para estabelecer uma linha de pensamento militar. ”Não existe esse grupo organizado, mas a sociedade pensa que há”, afirmou.
O 14º Congresso da Abraji aconteceu de 27 a 29 de junho em São Paulo, no campus da Universidade Anhembi-Morumbi.
*Antônio Graça é jornalista, associado e colaborador da APJor e cobriu o Congresso da Abraji
Publicado originalmente no site da APJor em 1º de julho de 2019
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