Artigo Fábio Ramalho

A imprensa e a democracia

Por Fábio Ramalho O incômodo da imprensa representa um controle social sobre as ações de agentes públicos ou privados. É a imprensa que abre espaço para o contraditório, avalia os prós e contras das decisões tomadas pelo poder público, e impede a “passagem da boiada”, como queria o ministro Ricardo Salles

Por Fábio Ramalho*

A divulgação, na sexta-feira 22 de maio, da reunião ministerial do dia 22 de abril, apontada pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro como prova da tentativa de Jair Bolsonaro interferir na Polícia Federal, deve ser julgada sobre a culpa ou inocência pelas instituições competentes, porém uma breve fala, do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, mostra a importância da imprensa para a democracia de qualquer país.

“Nós temos a possibilidade, neste momento que a atenção da imprensa está voltada, quase que exclusivamente, para o Covid. A oportunidade que nós temos, que a imprensa está nos dando um pouco de alívio nos outros temas é passar as reformas infralegais de desregulamentação, de simplificação”, disse Ricardo Sales.

O ministro justificou que a pasta do Meio Ambiente é o setor mais difícil de promover alterações, já que qualquer mudança é “pau no judiciário no dia seguinte” e completou: “Precisamos ter um esforço nosso enquanto estamos nesse momento de tranquilidade, no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de covid, e ir passando a boiada”.

Apesar de ser um pensamento pequeno perto do cargo que ocupa e, inevitavelmente, triste de se ver diante da grave crise sanitária que não só o Brasil está passando, mas o mundo todo está vivenciando, as palavras de Salles reforçam a importância dos países democráticos terem uma imprensa livre e soberana.

O incômodo que os veículos de comunicação, independente da sua linha editorial, possam gerar em qualquer pessoa que ocupe cargos chaves, seja na iniciativa privada ou no setor público, representa o controle social das ações que esse indivíduo possa adotar, seja no lado positivo ou negativo das coisas.

Ricardo Salles foi infeliz na sua colocação em querer aproveita-se de uma situação lamentável, que está ceifando milhares vidas ao redor do planeta, para promover políticas que atendam única e exclusivamente aos seus interesses, sem que haja o devido o controle social ou que abra espaço para o contraditório, fatores essenciais em qualquer regime democrático.

Quando se fala de setor público é preciso saber sobre as tomadas de decisões, avaliar os prós e os contras e acompanhar seus desdobramentos, por isso a comunicação é tão necessária.

Se a cobertura da imprensa causa mal-estar em setores do governo, quer dizer que não estamos tendo uma cobertura chapa branca dos fatos, ou seja, que pede benção para tudo e concorde cegamente com todas as ações governamentais, isso é um bom sinal, pois demonstra a maturidade da cobertura jornalística brasileira.

Por outro lado, é ruim ter a certeza de que o Brasil hoje flerta com o autoritarismo, com um regime que ataca incansavelmente os veículos de comunicação justamente por fazer esse trabalho de acompanhamento e controle social, incentivando agressões físicas, desqualificando o trabalho dos profissionais de imprensa e atingindo suas vidas sociais ou suas honras pessoais.

Mesmo com todos os ataques promovidos contra a cobertura jornalística, a fala do ministro do Meio Ambiente reforça que a imprensa está no caminho certo. Observando as ações do governo, criticando quando é preciso criticar e elogiando quando é possível elogiar.

*Fábio Ramalho é jornalista e associado da APJor

APJor

APJor

A Associação Profissão Jornalista (APJor) é uma organização sem fins lucrativos, criada em 2016 por um grupo de 40 jornalistas, com o objetivo de defender o jornalismo ético e plural e valorizar o papel do jornalista profissional na sociedade brasileira.